Pular para o conteúdo principal

Postagens

Mostrando postagens de julho, 2012

O CÔNCAVO DA AXILA DIREITA DE ROSALMA

Com o braço rente ao tórax e movimentos curtos, ela grafava com grande dificuldade em um bloquinho de notas as palavras que lhe vinham à mente logo abaixo do título que encabeçava a pequena página. Título escolhido intuitivamente, ao acaso, durante uma divagação ocorrida ali mesmo debaixo da goiabeira que deitava galhos e folhas para dentro da varanda da velha casa abandonada e arruinada na qual o pequeno portão aberto e enferrujado permitia o trânsito livre dos desafortunados vagabundos que buscavam abrigar-se dos olhos do povo ou do braseiro do sol ardente da tarde.   ‘EU QUERO UM AMOR’ era o título cabeçalho. E abaixo do título seguiam frases jogadas sem qualquer pontuação de trânsito gramatical, exceto o agigantamento maiúsculo de algumas consoantes iniciais que cumpriam bem a função de falso parágrafo ‘Que fale de amor Que fale de amor com sentimento Que fale de amor Que fale de amor com gravidade Que fale de amor Que fale de amor com comprometimento Que fale de amor Que fale d

BRB - O SONHO DE DOROTÉIA

Dorotéia dormia no mesmo quarto em que dormia Bob/Rock/Blues. Durante a noite, por muitas vezes, Bob/Rock chamava pela senhora. Dizia que queria o urinol. Ela dizia que ele estava de fralda. Ele dizia que aquilo era uma indecência. Ela cedia, mas quando enfim conseguia posicionar o papagaio de modo com que o patrão pudesse aliviar-se, via já ser tarde. Bob/Rock a culpava pela demora, resmungava por algum tempo, xingava de modo que a ofendesse mesmo sem que ela soubesse qual era o real sentido do xingamento proferido ‘criatura modorrenta!’ e, logo em seguida, virava para algum lado e roncava ao ponto de estremecer as paredes do pequeno e abafado vestíbulo. A enfermeira acompanhante, sonolenta, sonâmbula e cambaleante, atendia aos pedidos do exigente patrão enfermo. Noutro momento, o que era bem mais comum, Bob/Rock/Blues acordava dona Dorotéia para pedir-lhe um trago. A família já a havia instruído para que não cedesse aos caprichos do velho ‘mas quem é que aguenta esse homem gri

BRB - KUDURO, O CÃO

Pela manhã, o sol resplandece evaporando as boêmias gotas remanescentes do sereno noturno. Pessoas vão em seus ires e vires por algo que algum dia não fará todo sentido, ou muito sentido, ou sentido algum. A casa de Bob/Rock/Blues acorda com o despertador do celular do filho, praticamente madrugador, o primeiro a levantar-se. Ele toma café e folheia o jornal antes de partir para o trabalho. Vê Dorotéia chegar abrindo portões e portas com dificuldade devido à bicicleta que trás ao seu lado pelo guidão. Ela tem as chaves. E ela só se sentará para tomar café após ter dado o banho em Bob/Rock e lhe preparado para receber a fisioterapeuta que deveria chegar às sete. O cão Kuduro dorme no corredor. Desperta com Dorotéia abrindo a primeira fechadura, a do portão da rua. Ele não late. E se rosna, é prontamente advertido pelo filho de Bob/Rock, doutor Olavo Passo. Bob/Rock/Blues não gosta de receber ajuda para tudo que faz. É contragosto que aceita Dorotéia lhe conduzir da cama à cadeira de